sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

RAPSÓDIA EM DEZEMBRO

(Homenagem poética ao Dia Nacional do Samba)
Por: Claudio Fernando Ramos Natal-RN 02/12/2011 Brasil


No dia 02 de dezembro... Em um ano não especificado... Em um morro não identificado... Na cidade Maravilhosa...

Ivone Lara


Um homem, cercado por quatro paredes de tábuas, paredes que serviam de suporte para um enferrujado e inclinado telhado de zinco, dedilhava e balbuciava os acordes de uma singular melodia...

Candeia


O papel de pão, meio amassado, e o lápis, extremamente gasto, utilizados para registrar a letra da música, esperavam passivos sobre um caixote, que em tempos áureos, serviu ao transporte de legumes nas feiras-livres do Rio de Janeiro...



A luz da lamparina presa à parede bruxuleava, dando ao interior do barraco a sensação de um terremoto contínuo...

Clara Nunes


A esporádica visita que a brisa fazia ao sinistro ambiente, em nada melhorava a situação do solitário compositor... O deslocamento de ar provocado pela circunstancial visita, só fazia espalha no ar o fétido cheiro de querosene queimado e levantar a poeira do piso, ainda mantido em terra batida...



A música foi nascendo aos poucos e, indiferente àquele espetáculo triste e bucólico, ganhou às cercanias... Ganhando também o interior das casas vizinhas...

Leci Brandão


Vizinhos lânguidos, de rostos sulcados e olhos baços, abandonando suas casas puseram-se em marcha... Como se estivessem seguindo um cortejo, aproximavam-se cada vez mais... Dominados pelo som da música que, ao contrário de um réquiem, os convidava para uma noite de vida, poesia e alegria... Assim fazia o deus Pã com sua flauta mágica...



Um galo soltou um estridente som ao longe, que cortou a noite como um trovão de reduzida potência... Talvez entusiasmado pela dupla sorte de sua existência: nunca tivera que lutar para sobreviver no interior das rinhas, que não eram poucas na comunidade, nem jamais fora encarado como opção alimentar pelo seu proprietário, era um animal de estimação... Esses são ótimos motivos para celebrar...

Noel Rosa


Silenciosamente, provavelmente para não interferir na inspiração do compositor, todos que foram arrebatados pela magia da nova composição, foram chegando e se acomodando como podiam...



Em minutos todos os espaços foram tomados, não sobrou mais nenhuma cadeira quebrada, pedaços de troncos velhos, nem restos de tijolos que servissem de acentos... Os retardatários ficaram em pé...



Por alguns infinitos minutos o silêncio reinou absoluto, inclusive no interior do barraco... Em seguida a parte superior da porta, feita de madeiras de caixotes velhos, que estava parcialmente encostada, abriu-se totalmente...



O rosto de João foi banhado pela melancólica claridade que iluminava todo o espaço externo da residência...



Nem todos os presentes puderam ver a porta se abrir, o ângulo de alguns não lhe favoreciam a visão... Mas, mesmo assim, por conta do silêncio em que todos estavam imersos e do barulho que as enferrujadas dobradiças fizeram, não havia dúvidas... João se fizera mostrar...



Por infinitos segundos, João Gostoso mirou a silueta fantasmagórica de seus noturnos visitantes... Não teve medo... Aliás, ficou grato por todos estarem ali... Ao longo de sua existência nunca fora muito bom em granjear amigos... Seu quadro social só fez agravar suas frustadas tentativas em relacionar-se com o outro...

Clementina de Jesus


A lua cheia o ajudou na tarefa de identificação dos presentes... Mas João não carecia dessa benevolência da natureza, conhecia bem cada um de seus vizinhos, poderia reconhecê-los de olhos fechados, bastando que para isso fize-se bom uso de seus outros quatro sentidos... Porém, havia algo de estranho... Não sabia o quê... Nem o porquê...



Lábios começaram a entreabrir-se, vários tipos de dentes: postiços, brilhantes e amarelados, começaram a refletir o prateado que reinava na noite... João, depois de retribuir os sorrisos recebidos, sumiu da porta por instantes, para em seguida irromper abruptamente quintal a fora...



Nas mãos, João trazia uma parafernália de instrumentos de percussão... Todos foram colocados religiosamente no chão da pequena propriedade... Era seu terreirão particular... Mas, sem nenhum aviso prévio... Algo inusitado aconteceu...



Como se tivessem atendendo a um chamado interior, das sombras foram surgindo rostos definidos... Rostos famosos... Rostos poéticos... Rostos privilegiados... Rostos de sambistas... Os donos desses rostos apossaram-se, cada um, de acordo com a sua habilidade, dos instrumentos que João Gostoso hábil e delicadamente havia posto no chão, na falta de um local melhor...



Eis a estranheza que João detectara... Os seus o quês e por quês...


Os que haviam conseguido algum lugar para sentar cederam seus lugares para aqueles que agora possuíam instrumentos... Eles acomodando-se como podiam, testaram seus instrumentos... Em seguida o anfitrião, boquiaberto, com os olhos arregalados, que mais pareciam querer saltar das órbitas, com a voz embargada passou a cumprimentá-los:



- Boa noite Noel Rosa, Nelson Cavaquinho, Cartola, Zé Keti, Nelson Sargento, João Nogueira, Paulinho da Viola, Adoniran Barbosa, Beth Carvalho, Jovelina Perola Negra, Leci Brandão...



Eufórica e ao mesmo tempo sarcástica, uma voz bradou no meio do grupo de notáveis, era Luiz Carlos da Vila, que disse:


- Hoje é o Dia Nacional do Samba, e nós viemos aqui para homenageá-lo ou sermos homenageado?



Vários dos presentes balbuciaram palavras desconexas e menearam a cabeça concordando com o sambista... Mal haviam processado a proposição de Luiz Carlos, outra voz vaticinou:


- Nós passaremos, mas o samba jamais morrerá! Cantemos então!


Era Candeia, que em seguida cantarolou:


Deixe-me ir, preciso andar,

Vou por aí a procurar

Rir pra não chorar [...]


Não houve nem tempo para o primeiro refrão... Uma voz, dessa vez não identificada, roubou toda a atenção dos presentes, interrompeu Candeia e os que começavam a acompanhá-lo:



- Esperem, esperem alguém vem chegando...


Ao se aproximar mais do centro da roda, a silueta, visivelmente cansada, foi rapidamente reconhecida... Os olhos de João Gostoso faiscaram de claridade, como nunca antes havia ocorrido em toda a história de sua miserável existência, e este com voz trôpega disse:



- Dona Ivone Lara – primeira dama do samba... Inacreditável!


Aturdido, pensou em voz alta:


- Afinal, em que espécie de delírio me encontro?

Jackeson do Pandeiro


Todas as celebridades do samba presentes, citadas e não citadas, depois de mirarem o venerável semblante da Primeira Dama, lhe pediram a benção, chamando-a carinhosamente de madrinha... Ela, sem se fazer de rogada, humildemente lhes dizia:


- Estou presente meus filhos!


Com um lindo vestido branco, Clara Nunes virou-se para João Gostoso, talvez para despertá-lo do torpor em que ele se encontrava, e lhe perguntou:


- João, na condição de nosso especial anfitrião, o que você sugere que cantemos?


Tomado por uma inenarrável emoção, João sussurrou baixinho:


Não deixe o samba morrer

Não deixe o samba acabar

O morro foi feito de samba

De samba pra gente sambar [...]


A voz inicialmente fraca foi ganhando força e, gozando do privilégio ímpar da companhia dos notáveis... João Gostoso, com os olhos marejados mirava a lua sem parar... Uma outra coisa estranha... Dentre às várias já ocorridas... Alguém, bem no centro do astro iluminado, olhava para ele...


A princípio pensou se tratar de São Jorge, mas não havia cavalo branco nem armadura romana... Ao contrário, o que ele identificava era um homem da cor da noite, com porte de guerreiro, senhor de si e olhar altaneiro... Não sabia de quem se tratava... Talvez mais um delírio, em meio aos sonhos de uma noite de verão... O samba que João escolhera chegou ao fim...




Sem nada saber sobre o que ocorria com o psicológico de João Gostoso, Luiz Carlos da Vila ergueu uma das mãos e conclamou:


- Essa deixa que eu puxo!


E em seguida catou:






Valeu, Zumbi

O grito forte dos Palmares

Que correu terra, céus e mares

Influenciando a abolição

Zumbi, valeu

Hoje a Vila é Kizomba

É batuque, canto e dança

Jongo e Maracatu

Vem, menininha

Pra dançar o Caxambu [...]



O ronronar agudo de um felino despertou João Gostoso de um sono profundo... Com ouvidos treinados ouviu o gato afastar-se... Tudo estava em trevas...
Pensou em voz alta:
- Meu Deus tudo foi apenas um sonho! Tudo não passou de uma fantasia! Quimeras de um sambista...!

João Gostoso estava desolado... Seu relógio interno lhe permitiu arriscar sobre as horas, devia ser umas duas horas da madrugada... Logo teria de levantar... Mas, se quisesse, poderia ir ao Bar Esperança (o último que fecha)... Melhor não, muito longe... Ou ao Bar 20 de Novembro, bem mais perto... Melhor também não, muito tarde... Desistiu de ambos, talvez amanhã, quando viesse do trabalho na feira-livre, que fivava não muito distante da Lagoa Rodrigo de Freitas... Havia algo naquela lagoa que fascinava João...

Sentiu a fronha molhada, como é possível, não estava com calor... Deveria ter chorado enquanto sonhava... Não se importou muito com isso, virou para o lado tentou, com a alma aflita, conciliar o sono... Por onde será que Morfeu andava? Precisava, desesperadamente, voltar a sonhar.



 Cacau

(1) Trecho de uma composição poética.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Sempre de olho, muito legal, mas não pode ver mulher!


Crônica

Por : Claudio Fernando Ramos 21/11/2011 Natal-RN


No próximo sábado (26) haverá um grande encontro de artistas e admiradores do velho e bom samba. O local onde o evento ocorrerá, será o mesmo do melancólico encontro do ano passado: antigo Palácio do Governo (centro da cidade). A melancolia a que me refiro deveu-se por dois motivos específicos: pouca assistência do público e uma chuva intermitente a fustigar-nos durante quase todo o evento, fora isso, foi bom.



Esse ano, diferentemente do anterior, não teremos um membro do clã de Zeca Pagodinho. Porém, ouviremos um de seus “discípulos”, talvez o mais entusiasta dentre todos: Dudu Nobre. Caso não chova e o público concorra, temos os ingredientes para o sucesso.


Mas, algo me preocupa. Dudu Nobre não estará sozinho no palco; várias bandas, da cidade do Natal, farão também suas aparições por lá. Acredito que algumas estarão bem à vontade nesse dia, afinal, cantar e tocar samba é o que elas fazem o ano todo. Porém, o mesmo não pode ser dito sobre todas. E é por conta desse particular que eu me deito a pensar:


- Será que o sujeito mais famoso do mundo dos pagodes vai também dá às caras? Será que esse indivíduo, solícito por natureza, solicitado pelo gênero feminino ao extremo, membro honorário do universo dos pagodeiros, muleta, bengala e cadeira de rodas das bandas “arroz com feijão”, também foi convidado?


Tudo é possível, principalmente porque alguns de seus propagadores, aproveitando-se da necessidade que o show terá de aglutinar público, também ascenderão às “luzes da ribalta”.


Eu bem sei que você deve estar a questionar:


- Mas, afinal, de quem ele está falando?


Confesso que temo revelar-lhe o nome, apesar de largamente conhecido. Vai que não se lembraram de convidá-lo? O que seria ótimo, mas, muito pouco provável... Mas aí, porque, imprudentemente, resolvi mencionar-lhe o nome... O convidam, só para fazerem raiva... É bem provável.


Sendo assim, elementar meu caro leitor. O título desta “crônica dissimulada” é a única pista que poderás dispor no momento. Mas, advirto-lhe: caso descubra seu nome não cometas a heresia, nem o impropério de mencionar-lhe a identidade. Ao menos até o fim do próximo sábado. Eu lhe agradeço por hora, quanto ao samba, ele o fará eternamente!

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Natal Que Te Quero Samba.: HOMENAGEM AO CANTOR, COMPOSITOR E ARRANJADOR

Natal Que Te Quero Samba.: HOMENAGEM AO CANTOR, COMPOSITOR E ARRANJADOR: PRETO CHIC Por: Claudio Fernando Ramos - Natal-RN, 17/11/2011 Porque gosto do seu som: Tens personalidade. E isso é raro nos shows ...

HOMENAGEM AO CANTOR, COMPOSITOR E ARRANJADOR



PRETO CHIC

Por: Claudio Fernando Ramos - Natal-RN, 17/11/2011

Porque gosto do seu som:


Tens personalidade. E isso é raro nos shows Business.


És negro. Sem disso se envergonhar nem disso se aproveitar.


Cantas para seu público. Ao contrário de alguns que só o fazem pelo desejo de fama fácil.


Tens compromisso com a história da música. Isso é quase impossível no mundo do samba e pagode onde a maioria nem sabem quem são.


Falas com todos. Coisa rara nesse universo de "luas cheias" que insistem em querer brilhar mais que o sol.


És um cosmopolita (cidadão do mundo). Em um mundo dominado por nordestinos replicantes e cariocas ufanistas.


Tens talento. Coisa que não percebo na quase totalidade dos que se arvoram músicos.


Cantas o que é bom e com coração. Em meio a um universo de "maria-vai-com-as-outras".


Caso a incapacidade compreensiva de alguns ou a sua modéstia pessoal discorde de minhas palavras, tudo bem.


Não sou músico, falo apenas como um homem cansado do viciante marasmo das coisas.


Só estou fazendo formalmente o que muitos fazem informalmente: opinando.

Cacau

domingo, 30 de outubro de 2011

Natal Que Te Quero Samba.: O Barato da Cidade

Natal Que Te Quero Samba.: O Barato da Cidade: Por: Claudio Fernando Ramos ( Cacau) Natal-RN, 30/10/2011 Brazil Há nesta bela cidade uma série de espaços festivos, lugar comum em vá...

O Barato da Cidade

Por: Claudio Fernando Ramos ( Cacau) Natal-RN, 30/10/2011 Brazil





Há nesta bela cidade uma série de espaços festivos, lugar comum em várias cidades, principalmente às de caráter turístico. O samba, minha grande e singular paixão, tem sua sucursal em várias partes desse enorme e bonito país, não poderia ser diferente com nossa cidade. Nascido na Bahia, radicalizado na cidade maravilhosa (Rio de Janeiro), o samba, sem se fazer de rogado, subiu o morro. Negro por natureza, boêmio por formação, liberal na essência... Altaneiro, poético e cheio de gingado, desceu para o asfalto, das pistas, avenidas e sambódromos, ganhou o mundo; a exemplo de seus outros três irmãos, também negros: o Blues, o Jazz e o Reggae.


O Seis em Ponto , o Tom Maior, o Estação Ribeira e Taverna Pub, são lugares onde o samba tem voz e vez nessa cidade, mas, sinto que carecem de popularidade, o que já não ocorre com o Terreirão do Samba, Espetinho do samba e a Toca do Rato (quanto aos outros espaços, prefiro não citá-los, não dão ao samba o respeito merecido). Porém, quer sofisticados, quer populares, nada se assemelha ao que vem ocorrendo, a algum tempo, no bairro de Petrópolis (zona sul da cidade).


Com entrada franca, cerveja gelada e sem cobrança de conver artístico, todos os sábados (das 15: 00hs. às 19:00hs.), a alegria está garantida no Mercado de Petrópolis. Com espaço reduzido para dançar, as pessoas precisam encostar, com frequência, uma nas outras; o calor é constante e a música um tanto quanto descompassada. Mas, se deduzirem a partir dessas informações que no local não tem nada de interessante, enganam-se. Mesmo com tanta gente se tocando, não há, ao contrário de outros lugares, necessidade de segurança ostensiva, por um motivo bem simples: não há violência. Mesmo com uma banda de amadores ( percebe-se que os instrumentistas o fazem muito mais pelo prazer de tocar), toca-se samba (alguns, que a si mesmo se intitulam músicos profissionais, já abandonaram, infelizmente, essa boa prática). E quanto ao calor, sente-se o melhor de todos, o calor humano.


Esse blog (sambasobreasdunas.blogspot.com), em pouco menos de um ano já conta com acesso de quase 6.000 leitores, 20% desses leitores são de outros países, por conta disso, acho conveniente informar a esses leitores do Barato de Natal.


Na condição de carioca ( Rio de Janeiro) radicalizado em terras potiguares ( Natal), indico o Mercado de Petrópolis como espaço de lazer e cultura para os que vivem e visitam essa linda e generosa cidade. O “pior” que pode acontecer é sair de lá vitimizado pela alegria.





segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Natal Que Te Quero Samba.: O DIA ESTADUAL DO SAMBA (Homenagem aos sambista do...

Natal Que Te Quero Samba.: O DIA ESTADUAL DO SAMBA (Homenagem aos sambista do...: "Por: Claudio Fernando Ramos, Natal-RN 15/08/2011 Ary Barroso compôs o samba Na Baixa do Sapateiro, que tinha uma letra que exaltava a Bahi..."

O DIA ESTADUAL DO SAMBA (Homenagem aos sambista do Aquivo Vivo)


Por: Claudio Fernando Ramos, Natal-RN 15/08/2011
Ary Barroso compôs o samba Na Baixa do Sapateiro, que tinha uma letra que exaltava a Bahia, sem nunca ter visitado nenhuma cidade baiana. Mas na primeira vez que ele pisou em Salvador, num dia 2 de dezembro, o vereador baiano Luís Monteiro da Costa aprovou uma lei que declarava que aquele dia seria o Dia Nacional do Samba, numa forma de homenagear o compositor. A partir desse acontecimento a data tornou-se um dia para se comemorar toda a riqueza do samba, um dos principais patrimônios culturais brasileiros.

Em nosso Estado é curioso ver, principalmente na mídia potiguar, o que ocorre nesse dia. Alguns pagodeiros (que ao longo do ano tocam de tudo menos samba), aparecem em horário nobre do jornal local ensaiando acordes e tons do velho (jamais ultrapassado) e bom samba. Quando a humildade permite, o que é extremamente raro, eles (os pagodeiros convidados) até fazem um único e razoável show em homenagem ao aniversariante (o samba). Depois disso nada mais resta que mereça nota, nem a imprensa, nem os pagodeiros convidados prestam mais homenagem ao samba, a não ser quando isso se tornar novamente conveniente.

Hoje, dia 15 de agosto, o samba ganhou uma “nova” data. Mesmo sem a força institucional que teve o vereador baiano na promulgação da lei, o grupo Arquivo Vivo vem ao longo não só de um, mas dos outros 364 dias que constituem o nosso calendário gregoriano, homenageando esse verdadeiro patrimônio não material do nosso povo, o samba. Por conta disso não julgo ser exagero ou qualquer outra forma de ufanismo, associar a história do samba com a história do próprio Arquivo; afinal, eles nasceram em pleno Buraco da Catita (hoje um reduto considerável de boa música na Ribeira), do samba e para o samba.

O samba já foi negro, semi-alfabetizado, dos guetos, dos malandros... Hoje é plural, é intelectual sem ser esnobe, é antigo sem ser vencido, é moderno sem ser frívolo, tem muitas faces sem, contudo, perder a identidade... Hoje é o terceiro aniversário do Arquivo Vivo, hoje é o dia em que, por mérito, o Rio Grande do Norte deveria comemorar o dia Estadual do samba.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Cariocas em (sem) Natal

Cariocas em (sem) Natal
Por: Claudio Fernando Ramos
No último sábado estive, em companhia da namorada, em dois ambientes, próprios da classe média natalense (ambos em Ponta Negra), que decidiram contratar bandas de pagode. Se o objetivo dos proprietários era angariar público, ótimo; pelo que vi esse objetivo vai para além do satisfatório; se juntamente com isso, desejava-se alegrar e entreter o público, excelente; as duas bandas fazem isso muito bem... Porém, algo me chamou a atenção.
Natal é uma bela cidade. Na minha modesta opinião, a mais bela de toda a Região Nordeste (só não é melhor por conta de um pequeno entrave: as poderosas oligarquias que tão tenazmente se revezam no poder, são afeitas aos sofismas), isso acaba por atrair moradores de várias partes do país para viverem nessa espécie de paraíso terrestre; os cariocas têm uma expressiva representação nesse particular. Essa significativa presença dos cariocas nessa cidade seria algo fantástico para todos, natalenses e cariocas, não fosse a hipocrisia desse “povo” da Região Sudeste (nesse particular incluo também os de São Paulo).
Todas às vezes em que troco ideias com esses “estrangeiros” eles se portam de forma dicotômica, ou seja, criticam a cultura nordestina (quando estão entre cariocas, principalmente quando acabam de chegar do Rio), mas fazem tudo semelhantemente aos nordestinos quando isso lhes é conveniente (principalmente no caso de alguns músicos do pagode).
Somos uma brava gente (o povo brasileiro), temos resistido, ao longo de toda história,  toda sorte de violência, exploração, omissões etc. Nossos grandes líderes “democratas” de hoje, no passado não muito distante, foram, com pouquíssimas exceções, todos amigos de caudilhos (chefes militares). Não precisamos de mais essa hipocrisia cultural. Para se tornar “famoso” ( entenda: arrebatadores de corações carentes) ou ter um pouco mais de dinheiro na conta (algo extremamente necessário para se viver, é fato), não se deve abandonar princípios. A grande mídia massifica os pensamentos, disso todos, com um mínimo de bom senso, já sabemos. Temos muito poucas opções, ou seja, para agradar, na maioria das vezes, temos que dançar conforme a música. Então por favor, não me venha com esses chiados exagerados, esses: e aí cumpade (ao invés de compadre), ou coisa que o valha.
No Novo Testamento o apostolo São Paulo exortou firmemente, aquele que os católicos dizem ter sido o primeiro papa (São Pedro) com as seguintes palavras: “Você é judeu, mas está vivendo como os pagãos e não como os judeus. Como pode, então, obrigar os pagãos a viverem como os judeus?” (Galatas 2.14) Sociedade Bíblica Católica Internacional e Paulus – 1990. Sou carioca e gosto muito disso. Também gosto de viver nessa bela e receptiva cidade. Sei bem do que gosto e do que não gosto. Durante alguns anos, na condição de professor de três grandes escolas dessa cidade, sustentei posições, em sua maior parte, conflitante com o jeito manobrado da maioria (que nada falam de moto próprio, só optam pelo senso comum), mas sem nunca esquecer que existo em um Estado de direito e, por conseguinte, todos têm direito de escolher, mesmo que essas escolhas se dêem com cartas marcadas. Sei o quanto alguns ficam insatisfeito com o que escrevo; mas afirmo, faço-o na condição de fã, não de algoz. Ouço várias queixas das pessoas que gostam da boa música dos guetos carioca; algumas dizem: eu não vou mais lá (não conseguem explicitar isso para os músicos). Penso diferente; irei menos, mas ainda irei, serei otimista (ao menos nesse particular), talvez melhore, pior do que está não fica. Será Tiririca?
Milton Nascimento em uma de suas composições diz que nunca seremos uma grande nação, enquanto estivermos de frente para o mar, mas de costas para o interior. Se o que se gosta é tudo (axé, sertanejo, funk, pagode...), ou seja, algumas bandas não têm uma característica musical pré-definida; que tal assumir isso desde o início? Quem for lá já sabe, de antemão, o que estará passivo de ouvir, uma verdadeira salada musical: mambo, maxixe, salsa, vinagrete etc.  Agindo assim não se engana e nem se é enganado por ninguém, e o que é melhor: não se fará necessário dar satisfação a nenhum “fã” que se prontificar a segui-los e, que por hora, encontra-se decepcionado.
Cacau, Natal-RN 30/05/2011  
 

sábado, 28 de maio de 2011

CALCANHAR de AQUILES

Por: Claudio Fernando Ramos
Retornei, voltei a freqüentar o Buraco da Catita localizado na Ribeira, antigo centro da cidade do Natal. Esse retorno tem sido muito prazeroso, conheço esse espaço desde sua fundação. Porém não foi para falar sobre esse excepcional espaço cultural da cidade, se bem que ele por si só, merece linhas e linhas dos mais entusiasmado elogios, mas para tratar de um velho e malhado assunto: o samba.
Afinal, qual é o calcanhar de Aquiles do samba (nesse caso em especial ao falarmos sobre o samba, mesmo cônscio de suas singularidades, estaremos falando também sobre o pagode) em Natal? Desconfio que essa não seja uma pergunta tão simples de ser respondida. A dificuldade não reside no fato da resposta ter um teor acentuado de complexidade, e que por isso careceria de estudos e pesquisas profundas, nada disso. A ausência da simplicidade localiza-se na pluralidade, ou seja, são tantos os motivos e razões que não sabe-se como começar.
Abordarei um, dentre os vários existentes. Quem faz samba/pagode deveria, a rigor, gostar de samba/pagode. Em princípio, todos que lerem esse artigo ficarão desconfiados, mas ao fim creio que prevalecerá o bom senso. Um bom espaço para música, principalmente músicas com forte apelo étnico, como é o caso das músicas de grupos afro-descendentes, é aquele em que se possa ter contato, situação propícia para interagir,  manifestar carisma, ser espontâneo. Alguns organizadores do samba/pagode parecem desconhecer ou ignorar alguns princípios básicos do mundo dos negócios. Em espaços quase insalubres o que nos tem sido oferecido é o mínimo.
Os “empresários” desses espaços ficam envolto em ações administrativas (contando dinheiro, vendendo fichas, etc) e esquecem que seu maior patrimônio reside na satisfação de seus clientes (falar com eles, ouvi-los, sentir, na medida do possível, o que eles sentem).
 Mau atendimento (por incompetência, apatia (talvez) e, às vezes, por questões absurdas como ciúmes do cônjuge). Não separa-se, adequadamente, o pessoal do profissional (isso inclui também o uso indiscriminado de alucinógenos). Se a administração é tão importante, e de fato é, por que situações como: som ruim (qualidade do que se ouve e altura em que se ouve) e banheiros (horríveis tanto no jeito quanto na forma, principalmente para as mulheres) não melhoram? Não foram poucas às vezes em que tive que dividir esse espaço intimo com pessoas drogando-se, sem contar que não se pode lavar as mãos depois de qualquer ação.
O preço da cerveja vem sofrendo majorações na maioria dos espaços dedicados ao samba/pagode. Está cara? Nem tanto. Porém não é justo que ao cliente/consumidor, que parece significar coisa alguma,  não seja dada oportunidade de escolha de marca e, por conseguinte, de preço. Se no início paga-se R$ 3,00 por uma cerveja do tipo “A”, no final paga-se o mesmo valor por uma cerveja do tipo “B”, em razão da primeira ter acabado.
Quando haverá progresso de ideias e de ações para esses que fazem o samba/pagode em nossa cidade? Querer ganhar dinheiro, todos queremos, mas é preciso ter algumas outras coisas além da “ganância”.
Lendo a obra de Franco Cambi (A História da Pedagogia) aprendi que, na condição de professor, ensinar é, também, aprender. O Buraco da Catita não é paradigma de satisfação plena, mas sem nenhuma sombra de dúvida tem feito escola nessa cidade. E, se hoje eles podem ensinar como se faz com: humildade, qualidade, quantidade e competência, é porque nunca declinaram da alvissareira condição de eternos alunos.  
 Na obra de Homero, Ilíada, o Mito Grego narra que a morte de Aquiles, campeão dos gregos na luta contra os troianos, deu-se por um pequeno ponto de vulnerabilidade em sua armadura, o calcanhar. O samba clama por uma blindagem em Natal, uma nova armadura sem calcanhares letais.
Cacau, Natal-RN 28/05/2011

domingo, 27 de março de 2011

Eternos dão o tom no Tom



O melhor de estar aqui é que o outros não vão aparecer.

Certamente serei taxado de obscuro, enigmático, hermético ou coisa que o valha. Pode ser... Estiveras em meu lugar sentirias o mesmo; garanto.

Aqui o tom é outro. Localizado na rua: São José, na belíssima cidade do Natal, encontra-se o bar Tom Maior. Este é um daqueles lugares em que você se sente bem sem fazer muito esforço... Boa cerveja, ostra fresca (delícia), gente bonita, amigos e o que é melhor: boa música. Quando falo de boa música estou referindo-me mais especificamente ao samba; diante de meus olhos tenho a seguinte faixa: “Aos domingos 15hs. – samba de raiz.”

Agora você deve entender o “enigma” inicial desse artigo. Aqui não serei importunado pelos sambistas de meia-tigela que grassam as pamparras pelos rincões dessas paragens.
Ontem (26), um canal de televisão pública (Tv Brasil) veiculou uma reportagem sobre um espaço assaz badalado de nossa cidade, Buraco da Catita, os músicos entrevistados enfatizaram a necessidade de se ter mais espaços para a boa música; chorinho. Essa reportagem me faz pensar que a faixa posta nesse estabelecimento é, e não deveria ser assim, um ato de “coragem”.

Até às 18hs. Na companhia do Grupo Eterno Aprendiz, sei que não sofrerei contrariações...

Preciso aproveitar, por isso escrever fica para mais tarde...

Cacau 27/03/2011 (17:32hs.)

quarta-feira, 2 de março de 2011

FILOSOFIA

Filosofia


Noel Rosa

Composição: Noel Rosa


O mundo me condena, e ninguém tem pena

Falando sempre mal do meu nome

Deixando de saber se eu vou morrer de sede

Ou se vou morrer de fome

Mas a filosofia hoje me auxilia

A viver indiferente assim

Nesta prontidão sem fim

Vou fingindo que sou rico

Pra ninguém zombar de mim

Não me incomodo que você me diga

Que a sociedade é minha inimiga

Pois cantando neste mundo

Vivo escravo do meu samba, muito embora vagabundo

Quanto a você da aristocracia

Que tem dinheiro, mas não compra alegria

Há de viver eternamente sendo escrava dessa gente

Que cultiva hipocrisia



domingo, 27 de fevereiro de 2011

Nada de Novo no Front



Nada de Novo no Front
Por: Claudio Fernando Ramos 27/02/2011 Natal-RN
Mudar é sempre bom, mas não mude tanto assim! "Olha que a rapaziada está sentindo a falta de um cavaco, do pandeiro e do tamborim..."
Du Nosso Jeito – Nome de uma banda de pagode, proveniente da cidade maravilhosa.
Na última sexta-feira, os rapazes fizeram uma apresentação no espaço conhecido como Toca do Rato (casa do meu amigo Carioca), na cidade do Natal. Estive lá, vi, ouvi e agora opino: Nada de mais expressivo aconteceu, ou seja, a apresentação não fugiu ao lugar comum da maioria das bandas de pagodes, principalmente para àquelas que diariamente garimpam um lugar ao sol, no glamoroso e restrito universo da fama. Rebolados, requebrados, mulheres ao palco (quinze minutos de fama ou cortesia para um próximo show) e muita sensualidade... Sem esquecer do sempre apelativo, bate palma aí! Como diria um grande cartunista: Até aí morreu Neves. Conclusão: viajaram muito, para muito pouco!
Paguei dez reais, cinco já estaria de bom tamanho. Porém, nem tudo está perdido, acho válida a iniciativa de alguns “empresários” da noite em tentar mudar um pouco esse saturado e inexpressivo mercado do “samba” em nossa cidade; a bem da verdade, o samba, ele próprio, anda meio sumido... A contra gosto, acho que lhe deram férias compulsórias.
Mas enquanto nada muda, vamos continuar ouvindo: MPB, forrós, gospel, sertanejo etc. Tudo isso em ritmo de pagode... Haja criatividade. Depois disso ir para casa dormir. O problema é dormir com um barulho desses.
“Se hoje o samba é branco na poesia ele é negro demais no coração.” Diria o mestre Vinício de Morais. Nem sambista era, mas faz uma falta!

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

O SAMBA TEM NOVA MORADA

Por: Claudio Fernando Ramos (Cacau) 31/01/2011
A dinâmica do comércio, dizem alguns ter vida própria, não permite erros. Talvez, contrariando crendices populares, nunca tenha existido o fator sorte nas relações humanas, quer seja às de caráter pessoal, quer às de caráter financeiros. Mas, é irrefutável o fato de que, oportunidade e competência são fatores decisivos nas mais diversas constituições da existência humana.
A casa de shows Espetinho, que se encontra na Praia do Meio, na bela cidade do Natal, vem de um passado de pouco auspícios; todavia, sob a batuta ousada e competente de Angélica e seu esposo começa, a seu modo, reescrever uma nova história do samba nesta modista cidade. Modista, porque sempre há os que sejam havidos por novidades, isso é bom, mas como dizia Clara Nunes: “Pedra que muito se muda não cria limo...”. Ou seja, perde-se o rumo da história, não se cria raízes, não há valorização das “boas” tradições.
São diversas as “casas” (alguns desses lugares não chegam a ser necessariamente uma casa) onde o samba e, mais ainda, o pagode se concentram nos fins de semanas. Algumas de ótimo nível, no que concerne a estrutura, outras sofríveis nesse quesito. Existem também alguns eventos mensais e outros esporádicos (Terreirão do Samba e o Samba da Lua, por exemplo)... Mas o que quero realmente dizer, sem maiores delongas, é que a mesmice tem tomado conta da maior parte desses eventos. Bandas se sucedem apresentando-se de forma semelhante; não posso saber o que se passa na mente de alguns “músicos”, mas permite-me o bom senso saber discernir quem vai ao palco como profissional, e os quem nem sabem o que significa essa palavra.
Uma vez contratado (quer por pouco, quer por uma quantia justa), faça seu trabalho. Uma vez no palco (quer em uma casa climatizada, quer em uma casa sem ventiladores), apresente-se com galhardia. Muitos “pedem” aplausos, mas isso deveria ser conseguência de um trabalho bem feito, não favores e concessões do público. Honra? Só ao mérito!
Devagar, mas de forma determinada, Angélica vem contrariando as superstições dos “pagodeiros”. A de que não é possível cantar samba em Natal, não há público, dizem alguns neófitos. No último sábado, Angélica pôs em sua casa duas conceituadas bandas para tocarem (Arquivo Vivo e Eterno Aprendiz)... Não me lembro de ter ouvido tanto samba em um só dia, em um só lugar, nesta cidade, salvo no dia nacional do samba.
Quanto ao amanhã, pouco ou nada se sabe, com já disse antes: essa é uma cidade modista; mas hoje o samba em natal tem nova morada: todos os sábados no Espetinho. Divirtam-se!










sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

POR QUEM OS SINOS DOBRAM

Faz-se necessária essa pergunta: por quem os sinos dobram? Porém, a resposta não poderia ser mais óbvia: Sra. Noilde Ramalho. Os grandes mestres educam por e com princípios; os oportunistas e desgarrados só o fazem por conveniência. Quais as consequências? Estes são sectaristas, retrógrados e mesquinhos, tudo o que ambicionam de fato é uma legião de seguidores submissos, incapazes de pensarem de forma autônoma, como só os miseráveis sabem sê-lo. Quanto aqueles, e nesse restrito grupo de notáveis é obrigatório que se arrole com destaque o nome de Noilde Ramalho, educam para a liberdade, mesmo em época em que ela seja desprezada (refiro-me aqueles "ratos" que amam segregarem-se no poder); educam com isonomia, por isso garantem a unidade em meio a diversidade; educam com amor, por isso é viável o atualíssimo discurso da inclusão; educam para a vida, por isso quando partem deixam uma insuperável e inexorável história. Procuro sempre fazer bem, tendo como inspiração o seu melhor. Sentirei saudades! Cacau, Natal 26/12/2010